quarta-feira, 21 de maio de 2008

Àquela

Ao redor daquelas doces casinhas
Feitas de pavio de macaxeira,
Um garoto sonha um dia
Em aprender o que é ter saudade.

Tanta vida em tão pequeno corpo
Transbordava-lhe a alma de tantas cantigas
E cantava o amor que um dia teria
Com os versos que um dia iria saber escrever.

Um dia ela veio,
Como uma sonata bailante
Em verdes panos, que de tão lentos e escorridos
Faziam seus olhos vibrar como dois vagarosos minuetos...

E dali em diante, seus sonhos fizeram-se fogo
Fogo calado, um tormento macambúzio
Choro de penas e dós que chorava
Infinitamente acordado esperando um afago matutino.

Houve anos em que ela morria também
Mas sempre voltava,
Sempre mais cálida, e no âmago uma fome ferina
Que saboreava cada paixão e envenenava seus donos,
Um a um, de tanta volúpia.

O garoto havia virado pedra
Amansado pelas décadas
Que o fizeram esquecer o gosto do néctar daquela voz,
Jocosa e agradável
Como as viagens que fizera para dela tentar desertar.

Jogou buraco com a morte todo domingo
Por anos a fio que nem contar mais pôde
Sempre ganhava.
De jogos de solidão ninguém soube mais que ele nessa vida.

Aprendeu a manchar todos os amores
Com um fel destilado dos próprios humores
Que gota a gota lhe iam matando,
Que a cada gota traziam reminiscências dessa mulher-tempestade
Que choveu e cegou todos os seus sentimentos,
Deixando-o descalço ao sabor da terra,
Que ponteou a sola de seus pés,
Outrora faceiros,
Agora desabridos.
Um dia voltou ao seu povoado
Sentou-se a margem do nada
E revirou montes de nostalgia lamacenta
Em busca de encontrar a inocência que achou que um dia
Haveria de ter tido,
Sabe-se lá quando...

A morena não voltou porque nunca se foi
E as promessas que fez para os próprios botões
Achou uma a uma e ali disse adeus.
Iria buscar o reino daqueles que amam sem ferir.
Lá onde deságua o mar dos meninos sem coração
E enterrá-las sob a areia fina e marejada.

E lá vaguearia até que o infinito colocasse um calço em sua vivência,
Riscando na praia e nas rochas aquele nome profano
Daquela dama que de uma só vez
Deu-lhe toda vida
Com a condição de que ele nunca a vivesse
Sem antes beijá-la,
Para poder então morrer no cais das eternas juras desentendidas
Que um dia quiseram fazer coloridas
Toda flor (amor!) que nesse mundo quisesse se fazer nascer.


Jaisson.
Maio de 2008.

Nenhum comentário: