segunda-feira, 23 de março de 2009

Amor e seus outros.

O Amor só comporta uma explicação negativa
Não se diz o que é,
Mas o que ele não pode ser,
O que ele não comporta:
Sínteses, teorias, cosmogonias,
Teleologia, escatologia, silogismos
Retórica, sofística, exegese
(DRs encaixam-se em exegeses)
Analítica, analistas, anátemas
Antíteses.

Amor não é descaso
Frívola madrugada de suor.
Não é lira,
Ou bandeira de rei.
Amor não é conhecimento
Leis, sistemas
Tradição, nem poema
Ou mesmo compaixão.

Nada disso é Amor. (Ou não mais?)
Ele cansou de ser verdade
Enjoou de ser poeta
O amor quer férias do mundo.
Afinal, nem pagar a conta pôde, coitado...
Esse valente romântico,
Quer ser outro,
Quem sabe Saudade, quem sabe Pudor.
Afinal foi expulso do trono,
Dado como desengano
Apoteose da precariedade...
Amor agora é anti-Édipo
Embora velho e cego,
Perdeu o nome,
Amor não é mais amor.
Talvez seja só
O corriqueiro
Lúgubre indulto,
Do jeito-verbo
Amar.


J.
Março 2009.

domingo, 15 de março de 2009

Os primeiros e os últimos

O folião de fevereiro,
O campeão da vida folgazã de fim-de-semana,
A moça bala(nça)deira, strip-glitter.
Sujeitos alegres, ruidosos
Qual a tela plana escarlate
Que os apresenta a vida de todo domingo à noite...

O poeta dorido
Redator de guardanapo-de-papel
O filósofo cor-de-sépia, escritor de teses em preto-branco.
Sujeitos tristes, silenciosos
Qual o grito dos sem-nomes
Que rasgam surdos o aproveitar-da-vida de quem com nada se importa

Os Primeiros cantam de dia, choram de noite
Gritam e bebem no dia de Saturno
Suspiram e fustigam no dia do Sol.
Vestem-se das cores belas sobre a pele
Pra guardar sob ela o cinza frio de se saber inerte
Inútil e volátil viver que tem medo
Porque sabe que seu início, seu meio e seu fim
Serão o seu nada.
(O seu e o do mundo.)
Sem sentido porque não haverá sequer lembrança.
E estes são os sujeitos alegres.


Os Últimos cantam o dia, choram a noite
Podem gritar e beber na ponta do verso cada hoje
Embebido de ontem, adocicado de amanhã.
Vestem-se de trapos sóbrios e risíveis sobre a pele
Para guardar o bem de fato valoroso:
Alma quente que encara o temor
Porque sabem muito sobre o nada
E vêem o início, o meio e o fim com olhos no céu
(que é de todos e de ninguém)

E não apenas na porta de casa.
E estes são os sujeitos tristes.


Os Primeiros querem aproveitar a vida.
Os Últimos querem que a vida lhes aproveite pra algo.
Os Primeiros temem acabar de dor.
Os Últimos temem a dor de acabar.
Os Primeiros usam o universal para justificar o descaso.
Aos Últimos só se lhes permite o particular para isso.

Os Primeiros sempre serão os donos da (triste) alegria .
Os últimos sempre serão os senhores da (alegre) tristeza .
E eis que não há moral na história, nem ligeiro provérbio,
Uma vez que:


Os Últimos nunca serão os Primeiros.
E os Primeiros, talvez nunca serão.


Jaisson.
Mar. 2009.

quarta-feira, 11 de março de 2009

O vôo de Oraci.



Injusto Minos, criou destino
Mas assim fazendo
Logrou dar ao homem asa indomável
Fazendo da fúria passagem aos céus
E do flerte com o Sol
Amor.

Há quem voe sereno a toda vida
Mas tão perto do chão
Não vão saber nada dela.
O olho do homem é inútil
Se não puder ver tudo
Do céu.

(O herói não é aquele que é eterno
Planando raso, de tédio.)

Impávido filho, ousou desatino
Mas assim agindo
Domou os ares do vento impérvio
Luzindo, como sentinela dos tempos
Tal o furor do seu seio,
Sonho.

Houve então única’lma a coser
Tão fino cetim de tom célico
Feito da pele que cobre as abóbodas,
Do firmamento arrancada
Pelas mãos daquele foi colhido da queda
Pelo mar.

(O herói é o que sabe ser finito
Fazendo da arte, o remédio.)

Rompeu-se em águas profundas
Asas em pedaços pela orla...
“Pobre novel, tão imprudente!”
Diziam os fatigantes de sempre.
Vil censura de quem não viu
O real laurel.

Na areia fina lhe aguardava, pacata
Alma moça para socorrer,
E encantou-se, tão belo pano
Segurava firme o moleque dos céus.
Ah, face sutil ele viu, quando acordou
Sorriso dela.


E então, dizia o aedo inspirado pelas Musas
Cada coisa virou um tudo:


Celebrou o amor do céu:
Encontrar sonho pelo mar!
Pois verdadeiro e real laurel
Era o sorriso daquela
A marejar,
A Amar,
O amor.
(Morena.)




Jaisson.
Ao amigo Icaro. O mais novo náufrago do mar, do amar.